Total de visualizações de página

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Como afastar os jovens do mundo das drogas

Como afastar os jovens do mundo das drogas

Revista Época – 11 de junho de 2010


Uma máxima da medicina preconiza que quanto mais precoce o diagnóstico, mais fácil a cura. O princípio vale também para a dependência química. “Os pais devem se relacionar com os filhos, saber o que pensam, como se divertem”, diz Cláudia de Oliveira Soares, psicóloga e diretora do Grupo Viva, uma rede de clínicas especializadas em tratamento de dependentes de drogas. Para ela, a falta de diálogo é uma constante nas famílias que procuram tratamento. A falha na comunicação pode impedir que os pais percebam o problema nas fases iniciais. Além da incapacidade de fazer um diagnóstico cedo, ela leva a outras dificuldades para agir. Por falta de informação, preconceito ou incapacidade de enxergar a dureza da realidade que está ali, muitas famílias não sabem a quem recorrer. Ou não admitem a ideia de que a dependência seja uma doença crônica. “Eles demoram a procurar tratamento, costumam responsabilizar as companhias dos filhos ou tratar o problema como uma questão moral, de sem-vergonhice ou falta de autoestima do dependente”, diz a psiquiatra Maria de Fátima Rato Padin, especialista em dependência química e diretora clínica da assistência ambulatorial da Unifesp. Maria de Fátima comandou uma pesquisa inédita, feita com 500 famílias em que havia pelo menos um dependente químico, para avaliar o impacto das drogas na vida familiar. Concluiu que, em média, pais e mães buscam ajuda em quatro lugares ao mesmo tempo ao descobrir um familiar usuário. Os auxílios vão desde internação e assistência psicológica até apoio de padres. “A pesquisa mostra que a busca por ajuda especializada fica no mesmo nível da busca de ajuda na religião”, diz Maria de Fátima. “É como se você tivesse diabetes e procurasse um padre para se tratar.” Para piorar o quadro de desnorteamento, a pesquisa mostra que 61,6% delas nunca ouviram falar nos Centros de Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (Caps), o serviço público destinado ao tratamento de usuários de drogas. “São famílias que lutam há pelo menos cinco anos contra a dependência química e desconhecem o principal serviço público de tratamento.”


Isso não quer dizer que os grupos religiosos não ajudem. Eles oferecem apoio às famílias e aos usuários. Usam a fé como alternativa às drogas e insistem na ideia de persistência para superar o problema. “O Narcóticos Anônimos ou os grupos religiosos passam semanas tentando persuadir o dependente a se tratar. Isso não ocorre no sistema público de saúde”, diz Ronaldo Laranjeira, psiquiatra, especialista em dependência e coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Estado de São Paulo.


Para o dependente de drogas, os grupos de autoajuda podem significar, no mínimo, esperança. “Naqueles momentos de maior vontade de usar a droga, de depressão, o apoio do Narcóticos Anônimos, de pessoas que tinham passado por situações como a que eu vivia, foi fundamental para evitar uma recaída mais grave”, diz Maria Eugênia Lara Silva, ex-dependente que frequenta semanalmente as reuniões do NA. Antes de encontrar no grupo uma saída para o vício, Maria Eugênia fazia parte de uma estatística que tem crescido em níveis alarmantes no país – e preocupa não só as famílias, mas também as autoridades. Por 12 anos, ela foi viciada em crack, um subproduto mais barato da cocaína cujo efeito destruidor é bem maior. “Foi amor à primeira baforada. Eu fumava e queria mais”, diz. Há pouco mais de um ano, ela acendeu seu último cachimbo. Até conseguir se livrar da droga, viu sua juventude evaporar de trago em trago. Ela largou a escola, brigou com os pais e foi morar com o namorado que a apresentou ao crack. “Fumávamos todo o nosso dinheiro, tudo o que tínhamos.” Nos anos de consumo irrefreado, Maria Eugênia engravidou três vezes. Morando com os filhos pequenos, consumia crack dentro de casa. Saía de madrugada, às vezes com os filhos, para comprar a droga e matar a vontade de fumar – um efeito incontrolável conhecido na linguagem dos usuários como “fissura”. O drama de Maria Eugênia não é isolado. Ilustra a vertiginosa ascensão do crack na pirâmide social brasileira. Maria Eugênia ainda sente falta do “barato” que a droga proporciona. “Estou de luto, e vou morrer de luto porque não posso fumar crack”, afirma. “Adoro o efeito do crack, mas hoje adoro mais a minha vida.”


Como ela, milhares de jovens nascidos em famílias bem estruturadas, de classe média alta, buscam uma saída para o inferno em que se meteram com o crack. “Antes, prevalecia o consumo de maconha, de drogas sintéticas e de cocaína, mas o crack se infiltrou entre esses jovens”, afirma o psiquiatra Laranjeira. “Há uma epidemia de crack no Brasil, uma epidemia sem barreiras socioeconômicas.”

Nem todos os usuários de crack são
pobres. Mas o crack
empobrece a todos


Como chegamos a esse ponto? E o que fazer a partir daqui? A dependência química é uma doença reconhecida pela Organização Mundial da Saúde. Não tem cura e não há remédios que evitem recaídas. Por isso os dependentes precisam de acompanhamento constante de psiquiatras, psicólogos e, principalmente, da ajuda das famílias (leia o quadro na próxima página). Com o crack parece não haver meio-termo. Até quem sempre se mostrou liberal em relação à descriminalização de outras drogas é contrário à tolerância com o consumo desse derivado da cocaína. O cantor Caetano Veloso afirmou que “deixou os pensamentos sobre legalização para mais tarde”, por acreditar na prioridade do combate ao crack. O deputado Fernando Gabeira, candidato ao governo do Rio de Janeiro e defensor da liberação das drogas, defende uma campanha de combate ao crack. Com razão: a droga já responde pela maioria das internações de dependentes no Brasil. “Há três anos havia mais usuários de cocaína, álcool ou maconha. Hoje, quase 100% são viciados em crack”, diz Cláudia de Oliveira Soares, diretora da Clínica Terapêutica Viva, de Piedade, uma das maiores do interior paulista.


No primeiro simpósio sul-americano sobre o combate às drogas, ocorrido no começo de maio, em Belo Horizonte, secretários de Saúde, políticos e especialistas se reuniram para debater os efeitos do crack nas grandes cidades. A maioria defende a prioridade no combate ao crack. “Ele é diferente de todas as drogas que conhecemos”, diz o sociólogo Flavio Sapori, coordenador do Centro de Estudos e Pesquisa em Segurança Pública da PUC de Minas Gerais. “Profissionais da área de saúde e funcionários de clínicas estão atônitos.”

EX-VICIADO
O agente literário Bill Clegg, que superou o vício em crack e escreveu um livro contando sua experiência com a droga.


A rapidez com que os usuários adotaram a droga ganhou impulso com a estratégia adotada pelos traficantes no fim dos anos 90: a venda casada. Muitos só vendiam maconha se o usuário comprasse junto pedras da nova droga. Essa fórmula conquistou o jovem acostumado apenas à maconha. Por causa da combinação de efeitos nocivos, a expectativa de vida de um usuário de crack não ultrapassava um ano. O fato de a droga matar com rapidez pode parecer um mau negócio para o traficante – mas o que eles perdem em duração da clientela ganham em margem de lucro. “A venda de crack dá mais lucro que a venda de cocaína”, diz Reinaldo Correa, delegado do Departamento de Investigações sobre Narcóticos (Denarc) da Polícia Civil de São Paulo. Segundo ele, o grama de cocaína custa até R$ 15, dependendo da pureza. Com essa quantidade, ele pode fazer várias pedras de crack, cada uma vendida por algo entre R$ 3 e R$ 5. Além disso, o crack tem muito maior poder de viciar.

Dra. Tatiana Raposo Grutila
Delegada de Polícia Coordenadora da Seção de Ensino
Tel.: (11) 3815-8964 ⁄ 3815-8761
Email: tatiana.grutila@policiacivil.sp.gov.br

DIVISÃO DE PREVENÇÃO E EDUCAÇÃO - DIPE

Copyright © 2008 Governo do Estado de São Paulo - Todos os direitos reservados

Nenhum comentário:

Postar um comentário